Artigo - Por que o Brasil nunca ganhou um Oscar? - Engenharia do Cinema
Desde que o Brasil é Brasil, o nosso cinema tem ganhado destaque mundialmente. Seja com obras como “Dona Flor e Seus Dois Maridos“, “Cidade de Deus” e os dois “Tropa de Elite“. É inegável que nomes como Sonia Braga, Wagner Moura, Rodrigo Santoro e Fernando Meirelles são nossos exemplos de qualidade e orgulho para nossa dramaturgia. Porém nestes últimos anos que vim ingressando nesta área cinematográfica, muitas pessoas vem me questionando “Por que ainda não conquistamos nosso Oscar?”
Vamos voltar aos anos 90, época onde o Brasil conseguiu levar para a categoria de longa estrangeiro “O Quatrilho“, “O Que é Isso Companheiro” e “Central do Brasil“. Foi um tiro certeiro dos responsáveis pela seleção, naquela época, já que conquistamos três vagas em menos de quatro anos. O glamour, o reconhecimento e o orgulho era sempre nítido na maioria de nós brasileiros ao falar sobre essas obras em quaisquer lugares do mundo.
Porém desde 2003, os responsáveis por esta seleção realmente estão completamente perdendo aquele tato e até mesmo se garantindo em opiniões e obras nas quais dificilmente conseguirão chamar atenção de pessoas não residentes do Brasil. “Cidade de Deus” não foi indicado como filme estrangeiro, mas conquistou indicações nas categorias de Melhor Direção, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Edição e Melhor Fotografia (graças a campanha de Harvey Weinstein e da própria Miramax, na época).
Realmente há possibilidades de um representante ser indicado em várias categorias naquela mesma edição, afinal se ele estreou em Los Angeles até 31 de dezembro, a indicação se torna válida. Mas isso não depende do Brasil ou até mesmo de algum órgão governamental, mas sim do interesse da distribuidora do filme nos EUA, em fazer campanha para o mesmo. Foi o que aconteceu com o recente “Democracia em Vertigem“, produção da Netflix que aproveitou a influência da cineasta Pietra Costa com os votantes, para tentar uma indicação como Melhor Documentário (e conseguiu).
Imagem: Columbia Pictures (Divulgação)
Um outro caso mais recente foi “Bacurau“, que mesmo não tendo sido selecionado pelo Brasil em 2019, a sua distribuidora nos EUA, a Kino Lorber, chegou a fazer uma breve campanha para o mesmo. Porém se tratando de uma marca pequena, em relação às concorrentes (como Amazon, Netflix e até mesmo Disney), obviamente a produção não foi indicada. Lembrando que neste caso, o filme só pode concorrer em todas as outras categorias que não sejam melhor filme estrangeiro (já que o mesmo não foi selecionado pelos responsáveis pelo Brasil).
Voltando aos responsáveis pelo nosso cinema, cada vez menos eles levam isso como uma espécie de “campeonato de ego“, “revolta política” ou até mesmo “favores para amigos“, pois a cada ano que passa as produções escolhidas realmente não são compatíveis com os filmes de outros países. Um claro exemplo é em 2010, pois enquanto nossos vizinhos argentinos estavam levando o ótimo “O Segredo de Seus Olhos” (que acabou vencendo o prêmio, naquele ano), os brasileiros levaram “Lula O Filho do Brasil” (que obviamente foi descartado na primeira leva dos pré-indicados). Enquanto um tinha um enredo totalmente plausível com o gosto da Academia, o outro possuía um enredo totalmente amador e que foi escolhido apenas para aumentar o ego da classe política da época.
Outro claro exemplo foi a indicação de “Bingo – O Rei das Manhãs“, onde mesmo contando a história de uma personalidade bastante marcante para nossa teledramaturgia, em contexto geral é mais uma obra sobre ascensão e queda de um ser humano (e isso tem a rodo nos cinemas dos EUA). Realmente não é chamativo para nenhum membro da Academia.
Nos últimos dias, um amigo comentou comigo que “Deserto Particular” seria um dos indicados. Ao ir procurar o material do mesmo, vejo que mais uma vez a seleção se baseou nestes três quesitos citados. Com toda certeza a produção vai fazer um certo burburinho entre a classe cinematográfica brasileira, mas depois vai acabar caindo no esquecimento em alguma plataforma de streaming.
“Você só critica, e realmente não sugere NADA para isso ser mudado”. Primeiro de tudo, não transformaria até filmes como “Turma da Mônica” em panfletagem política e iria apenas pela QUALIDADE em quesito geral. Se temos uma produção inspirada em uma obra literária de época ou até sobre algum fato histórico para o Brasil, com certeza a atenção deve ser virada para ele. Se temos um drama ácido com uma realidade que se encaixe com qualquer outro país, sem dúvidas selecionaria eles. Um claro exemplo de filme que ganharia fácil, se a campanha dele não virasse uma “chacota política”: “Aquarius” (que é uma grande obra prima do nosso cinema) do cineasta Kleber Mendonça Filho.
E você, o que mudaria para o Brasil finalmente levar um Oscar?
Gabriel Fernandes: Engenheiro de Computação, Cineasta, Crítico de Cinema, resolveu compartilhar seu conhecimento sobre cinema com todos aqueles que apreciam essa sétima arte.