Crítica - Jóias Brutas - Engenharia do Cinema
Desde a primeira exibição de “Jóias Brutas”, no Festival de Telluride, no final de agosto, muito foi citada uma possível indicação ao Oscar para Adam Sandler. Conhecido por comédias pastelões, sempre que este troca o gênero habitual, ele nos entrega ótimas atuações e produções. Mas aqui é diferente de tudo que ele já fez, pois estamos falando do seu personagem mais marcante e sua trama mais forte na carreira.
Aqui ele interpreta o joalheiro Howard Ratner, que acumula dezenas de dividas e se mete nos mais diversos rolos com artigos de terceiros e apostas. Mas o grande problema de sua vida se da a transação de uma gema bruta, que ele contrabandeou da Etiópia e caiu nas graças do jogador da NBA, Kevin Garnett (que interpreta a si mesmo).
O roteiro e direção dos irmãos Benny e Josh Safdie (“Bom Comportamento”), utiliza a estratégia da retratação do desconforto logo de cara, para indicar o que estar por vir. Sendo assim, o filme se abre com um acidente de fratura exposta na Etiópia e já corta para um exame de colonoscopia do Howard. Essas cenas parecem não ter ligação, mas no ponto de vista artístico vemos que ambas são desconfortantes e é exatamente a sensação que “Jóias Brutas” propõe ao espectador durante seus 135 minutos.
Após as cenas citadas, já começamos a acompanhar o dia a dia do personagem de Sandler, onde a cada momento ficamos mais indignados e inconformados com as atitudes esdruxulas de seu personagem. A atuação dele é realmente desumana, e não parece que é o mesmo cara que já nos entregou filmes como “Cada Um Tem a Gêmea Que Merece” . Não há um processo de desconstrução do personagem, mas sim um caractere que já foi destruído e vive numa realidade onde “está tudo bem pra ele”. É quando nós vemos que já estamos adentrando a mente de Howard, e vivenciamos tudo aquilo como se fosse conosco ou alguém relativamente próximo.
O trabalho dos irmãos Safdie é genial, pois de forma sigilosa mostram que enquanto Howard não tira o sorriso a ganancia do rosco, em sua volta mais e mais pessoas estão ficando indignadas com suas atitudes. Tudo isso é executado através do enquadramento no personagem citado e a câmera pegando todos a sua volta, logo em seguida, em cada momento que ele toma uma atitude discrepante.
Não hesito em dizer que se não existisse um certo “Coringa”, certamente o Oscar de melhor ator, em 2020, seria de Adam Sandler. “Jóias Brutas” não é só seu melhor filme na carreira, como não duvido que terá possíveis indicações nas categorias de roteiro original e edição.
Obs: “Jóias Brutas” estreia em 31 de janeiro, na Netflix.
Gabriel Fernandes: Engenheiro de Computação, Cineasta, Critico de Cinema e agora Radialista na Rádio RVD, resolveu compartilhar seu conhecimento sobre cinema com todos aqueles que apreciam essa sétima arte.