Crítica - Ângela - Engenharia do Cinema
Sendo o primeiro grande caso de assassinato que abalou o Brasil, em 30 de dezembro de 1970 (devido ao cenário midiático que estava crescendo na época), o crime envolto a socialite Ângela Diniz (interpretada aqui por Isis Valverde), foi alvo de discussões da mídia e do povo, durante anos, principalmente pela falta de consideração da justiça em praticamente inocentar (em um primeiro momento) seu então assassino Doca Street (vivido por Gabriel Braga Nunes). Nesta produção escrita por Duda de Almeida (da série “Sintonia“) e direção de Hugo Prata (“Elis“), não presenciamos nada disso, mas sim, o que aconteceu antes do crime.
Imagem: Star Productions (Divulgação)
O único foco deste longa metragem é mostrar Ângela em eventos da alta sociedade em um primeiro momento, e no segundo apresentar várias e várias cenas tórridas com seu então cônjuge Doca Street. Sim, o longa se resume a basicamente isso, não há uma retratação do pós-crime e a motivação deste ter cometido o ato é colocada de forma porca e aleatória (uma vez que suas crises de ciúmes, são mostradas de uma forma estranha).
Imagem: Star Productions (Divulgação)
A sensação que temos é do diretor Hugo Prata sequer não conseguir aproveitar o contexto da época (já que o Brasil estava vivendo uma era mais hippie, após a ditadura militar), pois ele resume tudo em cenas homeopáticas, sem vida, e que remetem a produções C que foram feitas pelo cinema na época da pornochanchada (que até hoje é um dos períodos mais vergonhosos do nosso cinema).
Embora ele nitidamente tente fazer algo como Quentin Tarantino em seu “Era Uma Vez Em… Hollywood” (que tinha como plano de fundo o assassinato de Sharon Tate, e inclusive foi alguns anos antes deste crime), faltou aquele gás mais ácido ao demostrar o contexto da época e como a própria Ângela era vista como uma Femme Fatale por onde passava (o que até hoje é dito por muitas pessoas que lhe conheciam).
Ao invés disso, vemos um conjunto de cenas aleatórias de sexo, discussões sexuais entre Ângela e sua amiga Toia (Bianca Bin) e um breve contexto sobre racismo por intermédio da empregada Lili (Alice Carvalho). Se pegarmos qualquer filme nacional dos anos 70 ou 80, em sua maioria, vão ser resumidos com estes tópicos, e foi totalmente jogada fora uma oportunidade de mostrar, até mesmo, o quão o país ficou dividido (já que o próprio Doca chegou a ser visto como herói nacional, por uma parcela da população) e abalado diante do caso (tanto que o podcast Praia dos Ossos, é mais rico que este próprio filme).
“Ângela” mostra que mais uma vez o cinema nacional não conseguiu retratar devidamente, uma história que por si só já era rica em pautas necessárias para discussão atualmente. Uma pena.