Espaço do Colecionador #6 - Julian Kober - Engenharia do Cinema
Como nós do Engenharia do Cinema nunca escondemos que apoiamos a mídia física, resolvemos criar este quadro que sempre irá trazer um colecionador da mesma, a cada 15 dias, sempre aos domingos. Com o propósito de mostrar que a mesma ainda vive e que existem várias pessoas que possuem vários filmes em suas residências, o quadro surgiu com o intuito de discutir e apresentar pensamentos sobre o andamento do mercado.
O papo de hoje é com o colecionador e jornalista Julian Kober, de 33 anos. Colecionador de mídia física desde a década de 90, frequentava videolocadoras e sempre procurava produções que lhe marcavam para completar sua prateleira. Fã de John Carpenter e Wes Craven, ele trata sua coleção não apenas com edições de famosos blockbusters como “Star Wars” e “Harry Potter“, mas também por histórias de filmes que inclusive possuem incríveis histórias por trás de sua aquisição.
Engenharia: Como você começou sua Coleção? Qual seu primeiro título em mídia física
Julian: Para responder essa pergunta, eu quero compartilhar uma história com vocês: era início da década de 1990 quando coloquei meus pés pela primeira vez em uma videolocadora. Chamava-se Buttlerfly, uma homenagem ao apelido da minha terra natal, Vale das Borboletas Azuis. A mesma se localizava na principal rua do centro da cidade, há poucos passos da relojoaria do meu pai. Isso facilitou muito quando eu era ainda uma criança, e tive a liberdade de perambular pela pequena Panambi, na época com quase metade da população atual.
A Butterfly se localizava em uma antiga casa estilo com germânico. Era necessário entrar pela lateral da construção, que tinha uma portinha de madeira antiga. Por se tratar de um lugar que vivia com as janelas totalmente fechadas – a única iluminação era das lâmpadas antigas que às vezes ficavam piscando -, aquilo cheirava a VHS, mofo e casa velha. Talvez muitos não gostavam dessa combinação de odores, mas para mim aquele cheiro era especial.
Para o pequeno Julian a emoção de entrar naquele lugar era a mesma que um fiel sente ao pisar em uma igreja: A locadora era o meu templo. O sábado se tornou um dia muito aguardado para mim. Por se tratar de um momento especial, a ida era aproveitada ao máximo. Provavelmente a minha memória esteja me sabotando, mas eu me recordo da Butterfly ter um acervo enorme. Eu tinha a impressão de estar em um labirinto de fitas. Deste modo, eu precisava passar fita por fita até escolher uma, ritual que podia demorar muito tempo. Era tanto tempo que minha mãe tinha tempo suficiente para ficar o quanto quisesse no salão e meu pai jogar bola.
Imagem: Autor (Divulgação)
Eu decidia os filmes pelas capas, e, quanto mais extravagantes e assustadoras, melhor. Quem viveu o tempo do VHS, sabe do que eu estou falando. Até metade dos anos 1990 talvez, raramente as capas dos filmes eram estampadas pela cara dos atores, como acontece hoje, o que deixou os pôsteres menos interessantes. Esses eram os filmes que menos me chamavam a atenção.
Eu gostava das capas mais absurdas possíveis, não é à toa que virei fã do cinema fantástico, especialmente de terror. A capa mais memorável era do filme “O Último Tubarão”, um rip-off italiano melhor que todas as continuações do clássico do Spielberg. Na capa tem um tubarão gigante com a boca aberta exibindo seu dentes afiados em uma pose ameaçadora enquanto destrói pranchas de Windsurf e é perseguido por um helicóptero.
Lembro-me que eu morria de medo de um filme italiano chamado Maya – O Ritual do Fogo e de um anime de horror semelhante a Akira, chamado Terror em Love City. Os dois tinham figuras saídas de um pesadelo na capa. Com medo, evitei os dois por anos com medo das capas. Uma pena, porque quando finalmente tive coragem de assistir, elas haviam sido jogadas fora.
Foi esta paixão por locadora que me motivou a colecionar filmes. Começou com Aladdin e Rei Leão, e mais tarde, ganharia Star Wars Episódio 1 – A Ameaça Fantasma e Harry Potter e a Pedra Filosofal. Mas eu não queria grandes blockbusters que você consegue assistir facilmente. Eu queria ter os filmes que eu realmente gostava, aqueles que juntavam poeira nas estantes.
Comecei de fato a colecionar filmes no ensino médio. Um dia, o atendente da locadora me contou que eu havia alugado Tubarão em DVD mais de DEZ vezes!!! Aí eu fiz os cálculos: ele havia pagado mais de R$ 50,00. Ora, se eu já havia gastado tudo isso só em um filme e sabia que assistiria mais vezes, fazia mais sentido comprá-lo e ter em casa. Na época, o DVD duplo, com luva, custava R$ 30,00.
A partir daí começou a coleção de DVD’s, que eu segui por uns cinco anos e cheguei a ter quase mil títulos. Claro, era outra época, tudo era mais barato e tinham muitos títulos disponíveis. E, se você sabia onde comprar gastava uma pechincha. Eu precisei vender parte da coleção para comprar minha primeira TV. Maravilhado com o mundo do Full HD, acabei deixando a mídia física de lado e vivi anos comprando HD’s externos para ter a minha verdadeira locadora. Parece uma alternativa viável, até você começar a ter seus HD’s queimados e perder centenas de filmes.
Um dia, não lembro o motivo, entrei em uma loja no centro de Porto Alegre que nunca estive antes e dei de cara com um reprodutor de Blu-Ray da Philips por absurdos R$ 100,00. Saí de lá e decidi que era hora de montar minha coleção em alta definição. Porém, diferente do que fiz na época do DVD, decidi não ter mais pilhas e pilhas de filmes em casa. Em Blu-ray, tenho somente aqueles que eu considero o “essencial do essencial”. Aqui, não tem filme só por ser raro ou pra encher prateleira. Cada filme tem uma história pra mim, algum significado, uma recordação. Por isso, sou o colecionador com menor acervo a participar desta importante e bacana iniciativa do portal Engenharia do Cinema, mas é sem dúvida a mais marcante.
Engenharia: Qual seus maiores títulos da coleção?
Julian: Como eu respondi anteriormente, cada título da minha coleção é marcante, independente de ser raro ou uma edição super mega especial. Entre os importados, cito minha coleção da Scream Factory, em especial os filmes do John Carpenter e Wes Craven. Dos nacionais, os meus favoritos atualmente são: Trilogia “Evil Dead” da Obras-Primas, “Eles Vivem” da Versátil, “Scream Queen” da FamDVD, “Repulsion” da Brotherhood e “Apocalipse Now” da The Originals.
Imagem: Autor (Divulgação)
Não tenho lá grandes raridades na minha coleção. Posso citar aqui o box da Quadrilogia “The Blind Dead” lançada pelo Blue Underground há 17 anos, que é em formato de caixão, e a coleção da franquia Phantasm que veio junto com a esfera. Outro que não posso deixar de citar é meu Steelbook do “The Beyond”, um dos mais lindos que tenho e um dos primeiros a adquirir.
Porém, posso estufar o peito e dizer que tenho alguns filmes autografados pelos diretores. Sim! O mais importante é sem dúvida Re-Animator, com a assinatura do falecido Stuart Gordon, com quem tive a oportunidade de assistir Dagon no cinema durante o Fantaspoa. Star Crash, uma cópia italiana de Star Wars, assinada pelo criador Luigi Cozzi. Hardware, um dos filmes mais subestimados do cinema fantástico, autografado pelo mestre Richard Stanley e o divertidíssimo Class of Nuke ‘Em High da Troma (meu favorito da produtora, acho melhor que Toxic Avenger inclusive) onde não só a lenda Lloyd Kaufman deixou seu nome como escreveu: “Julian, nunca vou esquecer do nosso final de semana no Haiti. Beijos, Lloyd”.
Engenharia: Com relação aos importados. Quais quesitos você acredita que compensa, na hora de trazer um título para sua coleção?
Julian: Por eu ser fã de filmes mais “undergrounds”, especialmente filmes de terror, eu recorro frequentemente aos importados. Dificilmente um filme como Alligator ou Piranhas 2 – Assassinas Voadoras sairá em Blu-Ray por aqui. E aí, eu não dou a mínima para o fato de ter ou não legenda ou dublagem em português. Claro que facilita, mas é tão raro que se tornou algo indiferente para mim.
Eu prezo muito pela qualidade do produto. Não adianta comprar só porque vem numa caixinha bacana se o filme vem em uma qualidade ruim ou sem extras. Gosto muito de comentários e making-of, por isso prefiro pegar edições que focam no conteúdo. Claro que é necessário pesquisar bastante antes disso, porque a diferença de preços é gritante de tão absurda. E às vezes, na loja que você considera a mais barata pode ter um valor bem mais salgado do que com outro vendedor. Então, essa é a minha dica, pesquisar bastante para não acabar gastando mais do que deveria.
Imagem: Autor (Divulgação)
Engenharia: Além de mídia física, você coleciona outras coisas?
Julian: Atualmente, coleciono livros e quadrinhos. Ando muito fissurado em um mangá chamado Berserk, uma fantasia violenta de fazer Game of Thrones ser coisa de criança. É triste, mas neste cenário de dólar altíssimo e preços absurdos, tive que parar a coleção de vinil e action figures. Espero que eu possa retomar as duas, pois gosto muito. Mas, antes disso, me preparo para começar outras duas coleções: a do 4K e do VHS, para um dia ter a minha própria Butterfly dentro de casa.
Engenharia: Quais os maiores problemas que você acha que a comunidade de mídia física enfrenta?
Julian: Em minha opinião, a comunidade está dividida. Ou melhor, polarizada, como tudo no Brasil. O ego fala mais alto, principalmente entre os influenciadores. Sabem que as opiniões deles são importantes dentro das comunidades e se aproveitam disso em troca de mimos. Caso contrário, metem o pau nos lojistas ou em determinados produtos.
Os colecionadores mais “experientes” sabem muito bem quem são. Infelizmente uma grande parte da comunidade ainda confia nesse pessoal e suas falas têm efeito direto na opinião de muita, mas muita gente. E é preocupante, porque no momento em que um influenciador vai à uma live para detonar um determinado filme ou uma loja, muita gente vai na onda.
Resultado do comportamento tóxico citado acima estão certos grupos no Facebook e no WhatsApp. Quando eu passei a fazer parte da comunidade, lá em 2020, tudo parecia uma maravilha. O mercado estava voltando a crescer, era um título atrás do outro, uma edição mais linda que a outra. Foi nessa época que conheci amigos para a vida, especialmente aqui o Clayton, Tailan, Álison, Vinnie Bressan e tantos outros que eu vou acabar esquecendo.
Imagem: Autor (Divulgação)
Porém, a cada lançamento, as comunidades foram se tornando mais tóxicas. Criticar um determinado lançamento, apontar uma falha, um defeito, isso é fundamental. Porém, a situação fugiu do controle, a ponto de que se você se manifestasse a respeito de um lançamento vinha uma galera te atacar. Não é à toa que a maioria dos lojistas saíram das comunidades, e isso é péssimo, pois o diálogo entre consumidores e vendedores é fundamental para manter o mercado vivo.
Um dia, resolvi comentar em um dos maiores grupos que a comunidade estava tóxica. Fui proibido de publicar temporariamente. Enquanto isso, uma galera que atacava sem o mínimo respeito permaneceu. Foi nesse momento que eu decidi sair do grupo, e sei que muito colecionador de respeito, inclusive pessoal que já participou desta coluna fez ou pouco se manifesta.
Hoje, me limito a dois grupos: o Espaço do Colecionador e o Movie Box. São duas comunidades onde a galera se trata com respeito e tenta manter viva a mídia física. A verdade é que nós precisamos dos influenciadores. E temos bons exemplos na nossa comunidade, cito aqui os Brothers e o RicNerd, que não usam da influência e dos seus espaços para atacar de forma irresponsável. Precisamos de mais gente assim. Agora, se por um lado os influenciadores têm criado este ambiente tóxico, alguns lojistas também não têm contribuindo com a melhora do cenário.
Já faz um tempo que não compro em pré-venda. E o motivo disso é de que cansei dos constantes adiamentos, que ficam recorrentes a cada lançamento. Dá pra contar nos dedos – e sobra – quantas lojas conseguem entregar no prazo ou até com antecedência. Então, prefiro correr o risco de perder uma edição e pegar somente após a mesma estar disponível para pronta-entrega.
Eu sei que a pré-venda é essencial para as lojas e para manter o mercado ativo, mas isso não significa que elas podem agir desta forma. Em minha opinião, a logística parece desorganizada e a comunicação deixa muito a desejar. Aliás, tem loja que apaga comentários ou te critica por fazer apontamentos sobre a situação, o que é péssimo. Pior que o atraso é o trato que alguns têm com nós, colecionadores, que compramos seus produtos. Eu ficaria menos frustrado com os adiamentos se as lojas se manifestassem com antecedência sobre isso. Mas não, muitos preferem esperar até o dia que deveria ser enviado ou até depois para anunciar que vai atrasar. E assim não vão conseguir me convencer a comprar na pré-venda. Sei que tem muito colecionador que continua a fazer isso só pra ajudar as lojas, mas a paciência está se esgotando.
As lojas e os consumidores precisam se aproximar, dialogar. Neste contexto, eu preciso citar aqui o Fábio Martins. Ele está nos grupos do Facebook e WhatsApp e é sempre muito prestativo, sempre respondendo de forma transparente e sem perder o molejo quando recebe críticas. Não é à toa que a FamDVD virou uma empresa querida entre os colecionadores. E falo isso aqui sem receber um jabá em troca, mas porque acho necessário citarmos bons exemplos para que os demais façam o mesmo.
E aí vamos falar dos colecionadores. Pessoal, vamos ser francos: Está tudo muito caro. Quem não percebe isso não deve sair de casa ou fazer compras no mercado. A fase do Blu-ray por R$ 29,90 acabou. O mesmo vale para as promoções “Pague 3 e leve 4”. Hoje, quando uma loja faz uma promoção louca é para acabar logo o estoque e parar de vender mídia física. Infelizmente, tem muito colecionador abutre, que espera essas ofertas absurdas e acha que está sendo “mó malandro” porque comprou um filme que custaria seus R$ 100,00 por R$ 10,00. É o tipo que só quer encher a prateleira e ostentar nos grupos o tamanho da coleção enquanto mais uma loja desiste da mídia física. Sinceramente, não tem colecionador pior que esse.
Estes são apenas um dos problemas que a comunidade enfrenta. Nós precisamos escancarar eles e conversar abertamente e de maneira respeitosa. Não adianta conversarmos no privado enquanto a situação só piora. Ou a comunidade se une para manter a mídia física viva ou temo que vamos ser obrigados a nos reunir em um grande velório.
Gabriel Fernandes: Engenheiro de Computação, Cineasta e Critico de Cinema, resolveu compartilhar seu conhecimento sobre cinema com todos aqueles que apreciam essa sétima arte.
hAHAHAHAAAAAAA.. conheço essa figura (JUlianKober) desde o dia que veio ao mundo dos mrtais (exato: ele é mortal nã´o é imortal). FOmos ligeiros não é Flavio Janke (abbraço). Mas comecei a dar mais atenção ao Julian, depois que o pai dele,pechando mepara um canto de uma sala, disse: “Tu não notou nada de diferente no JUlian, que tu não queira falar, mas que te incomoda…”. Eu respondi: “Qéisso véio, fumou outra baganinha hoe (baganinha=banana com farinha )”. “Mas olha como que ele brinca e se diverte, só os bichos de filme de terror, ele é diferente …”. Já sai lascando: “SORTE DELE VÉIO!!! Sediferente da grande maoria. OLha véio: da atenção cariknho, uma bicicleta umaarmade pressão e uma caixa de camisinhas, mostra como se usa e diz que aquilo não é para levar agua em acampamento!!! Certo, um bbeijo Lõnia, bertico, e demais familiares.